A realidade da violência obstétrica, repercussões emocionais e propostas de intervenções psicológicas

Entidade:
SBPH

Coordenador(a):
Sheyna Cruz Vasconcellos

Financiador do coordenador:

Resumo:
Embora o conceito de violência obstétrica seja discutível, é inegável a existência de um sofrimento psíquico neste cenário do parto e os profissionais envolvidos nestes procedimentos. Um movimento que pretende humanizar o parto tem, cada vez mais, dado voz às mulheres e implementado ações em vários âmbitos. A psicologia protagoniza algumas intervenções nesta direção que serão discutidas nesta mesa. Propõe-se então abordar: o parto do bebê cardiopata e as possíveis vivências de violência ocorridas nesse momento, as perdas perinatais e as fantasias parentais, e o pós parto domiciliar e as repercussões emocionais nesse pós parto de tal violência. A partir destas intervenções, delineia-se o papel do psicólogo com essas mulheres e famílias e quais ferramentas pode-se usar para um acolhimento, conforto e até mesmo mudanças no setor médico e hospitalar desses profissionais. Busca-se a escuta dos diversos atores envolvidos neste contexto para construir propostas mais amplas e ao mesmo tempo singularizadas.

Eixo:
II – Práticas Profissionais da Psicologia em contextos sem muros

Processo:
Processos Terapêuticos


Apresentações:

Reflexões sobre o parto do bebê cardiopata na discussão da violência obstétrica: cabe algo ao psicólogo na sala de parto?
– Simone Kelly Niklis Guidugli
A violência obstétrica é um conceito que somente nos tempos atuais tem tomado força no discurso social, mas há muito tem sido praticado. A mulher hoje encontra-se em um processo de “auto-autorização” para falar sobre, embora ainda não se encontre com voz suficiente para defender-se em determinadas situações da prática médico-hospitalar. Em tempos de fortalecimento do parto no seu contexto mais natural e menos intervencionista, como ficam as mulheres que necessitam da intervenção médica mediante a malformação cardíaca de seus bebês? Como é significada a cesárea, com seus procedimentos limitadores, nesta clínica, onde a vida do bebê muitas vezes depende da ação médica rápida e eficaz? Como é subjetivada a possível vivência de violência obstétrica quando o objeto de cuidado é o bebê e sua vida? Seria possível relativizar esta vivência a partir da mudança do cenário e do protagonista? O que pode o profissional psicólogo, dentro das limitações de sua prática clínica-hospitalar, atender à demanda de angústia da parturiente nesse contexto? O acompanhamento psicológico no parto do bebê cardiopata mostra-se como uma saída para a escuta da vivência de desamparo da mulher, propondo-se a empoderá-la e dar-lhe voz diante do cenário frio e objetivo de um centro cirúrgico. Propõe-se, nesta fala, a discussão e a reflexão acerca do possível trabalho do psicólogo no direcionamento de uma demanda social importante, polêmica e genuína, porém com especificidades tão significativas para o sujeito que neste cenário se encontra.

A escuta no contexto do luto perinatal e fantasias parentais
– Sheyna Vasconcelos
Cada bebê tem uma história que antecede seu nascimento e abriga as fantasias narcísicas dos pais. A perda de um bebê ultrapassa o que se pode identificar no nível biológico como a contagem das semanas gestacionais. O discurso do senso comum e da equipe de saúde não costuma validar e autorizar os lutos perinatais pois consideram o tempo gestacional em detrimento das fantasias parentais. Nesta ocasião a tendência em minimizar o sofrimento tem como efeito colateral o impedimento do trabalho de luto. Esse luto tem características incomuns e irreconhecível pelo entorno. Argumentos comuns e chavões são convocados para tentar, em vão, nomeá-la, mas o fato é que a experiência com a morte tem como característica sua irrepresentatividade.. É tarefa do psicólogo recolocar este luto em cena, validar e favorecer a expressão das fantasias sobre a criança que não sobreviveu. Oportunizar a mãe sobre a possibilidade ou não de ver seu filho e opinar sobre sepultamento e outros processos que aproximem a família deste ritual. A constatação e confrontação sobre a nossa condição mortal ativa soluções que podem fazer o sujeito avançar em direção a vida ou petrificar-se diante dela. A escuta que acolhe essa dor pode permitir a despedida deste filho e lhe conferir um lugar psíquico para esta família.

Violência obstétrica e as repercussões emocionais pós-parto
– Raquel Marques Benazzi Guirado
Identifica-se como violência, a imposição de um grau significativo de dor e sofrimento evitáveis. A violência obstétrica é um tipo específico de violência contra a mulher, como a falta de informação dos profissionais com a paciente, realizar procedimentos sem autorização, medicalização excessiva, entre outros, o que acarreta numa visão mecanizada dos profissionais de saúde, que tratam a mulher como objeto de trabalho. Após a situação da violência a mulher volta para casa e pode apresentar repercussões emocionais decorridas de tal fato. Uma doença psicossomática, conflitos conjugais e familiares e falta de conexão maternal. A mulher que foi violentada se sente traumatizada, e sem opção de ressignificar esse momento que foi idealizado e sonhado, o encontro com seu filho. Quando algo vivenciado é traumático, o inconsciente pode bloquear essa informação e gerar complexos a ponto da mulher não se conectar a maternidade. Essa desconexão pode levar a uma depressão, um movimento de introspecção, isso porque a situação difícil da vida, em que era necessária uma reação externa, a pessoa amputa a sua capacidade de ação, reprimindo a sua força, isto é, canaliza a energia que deveria dirigir-se para o exterior, para dentro, transformando-se esta numa força destrutiva e não construtiva. Assim o terapeuta deve olhar essa mulher como um todo, um corpo e psique violados, necessitantes de afeto. As ferramentas mais importantes são a clarificação e o acolhimento. Com isso dá se a oportunidade dessa mãe reviver a situação traumática e alterá-la em sua psique, iniciando um novo começo de ciclo.